Prólogo:
Recordando | Chocolate
Coincidências ocorrem em todo universo, inclusive fora
dele – caso alguém tenha explorado além da infinidade do universo, descobriria
que não é bem assim –, mas o mais incrível de observar nesse pedaço de infinito
seria o rumo dos acontecimentos formados a partir de algo idiota. Da mesma
forma que tudo está ligado, tudo está separadamente alterado por si mesmo, o
que não faz sentido, mas o conceito é esse mesmo. Mas apenas ver as coisas
acontecendo não tem muita graça, então creio que seja mais divertido e interessante
ver as coisas acontecendo em função de uma coisa que você fez. É algo
espontaneamente glorioso de se ver. Tudo acontece, se liga, se desliga, se
conhece, desacontece, faz acontecer, e outras coisas idiotas e legais que
esqueci, e tudo por causa de algo pequeno que você fez! Incrível olhar tudo
isso. Mas depois de alguns anos universais de espera, hora de ver o fruto de
meu trabalho, apenas ver o que ocorreu e outras coisas. A espera foi longa, e
necessariamente eu não precisava esperar, mas apenas para criar expectativa,
algo que não sentia desde que fiquei assim. Não dá para definir a forma,
estado, ou sequer compreender o que conheço como “eu”. Há muito perdi minha
noção de tempo, vejo tudo de forma diferente.
Acho que isso é inefável.
Eu sei o que significa, mas não quero lembrar agora.
Não quero estragar o momento.
Hora de voltar. Voltar para ver tudo. Tudo que
aconteceu (e não aconteceu, etc., etc.)
Ah! O passado do universo, a época em que tudo não
parecia ter sentido algum, o que era bom e provocava insegurança... Creio eu
que vivi nessa época, ou teria sido antes? Hum... Não tenho que levar em conta
só o tempo, mas acho que foi antes. Que comecei isso. Criei aquilo para
satisfazer meu desejo de observar. Apenas ver e sentir. Monitorar, observar, e
aproveitar o momento. Criei esse habito para satisfazer meu tédio decorrente do
que aconteceu comigo. Para um ser que não precisa se submeter às leis chatas da
física de todos os universos, o ato de viver se torna tedioso. Pelo menos foi
isso que as entidades que são consideradas deuses pelos seres com alma (e sem
alma se tiverem muita fé) me disseram. “O universo, tudo o que você compreende
como existência, acaba ficando pequeno”. Eu me divirto observando eventos. É
interessante. O que eu fiz no tal planeta dos... hã... Humanos, eu acho, foi
bem interessante. Uma coisa tão pequena que pôs em jogo toda a existência de um
universo e a felicidade de 365 sistemas de certa galáxia dessa realidade. O que
fiz o tempo (que não tem muito significado para mim) inteiro foi observar.
Nunca perde a graça – se é que tem uma coisa dessas aí. Olhar tudo o que
aconteceu com o universo graças a minha interferência. Acho que havia uma
coincidência escondida nos meus pensamentos anteriores, mas não quero
atrapalhar o momento. Apenas observar.
Muito bem, tudo começou... Com uma lata de
refrigerante?
É, acho que foi isso mesmo.
O sabor em questão não era muito importante, já que a
dica É Usado Frequentemente Em Vinhos seria uma dica bem obvia, mas diremos
assim mesmo. É uva. A forma de como isso começou foi estupidamente inocente, já
que supostamente um refrigerante de uva não deve fazer muita coisa em relação
ao universo. Devia. Se conhecermos o universo bem (ou não), podemos afirmar
que: qualquer coisa pode desencadear qualquer coisa; e nenhuma coisa pode
desencadear nada.
Mas o que esse refrigerante fez? Foi bem simples, ele
teve seu preço aumentado. Algo relativamente comum, já que o planeta e
realidade de onde esse refrigerante estava tinha humanos. Naquela realidade, os
humanos eram impossíveis de serem descritos por qualquer outra raça na galáxia
que não tenha avançado na física o suficiente para viajar entre realidades –
claro que contava também se eles tinham vontade e/ou curiosidade suficiente
para descrever os humanos. Mas eles em si descreviam o universo onde eles
estavam. O universo onde eles estavam (podemos usar quando eles estavam, por
que eles estavam, mas não há regra gramatical que me impeça de apenas falar
onde) tinha regras bem estupidas e restritas, sem falar do fato de que o
universo em questão é feito de equilíbrio – coisa inútil para um universo como
aquele – e ao mesmo tempo, de inconstância. Humanos buscam o equilíbrio (que
para eles é sinônimo de inalcançável), porem são inconstantes, principalmente
sobre o que fazer da vida. Completamente indecisos, mas equilibrados. Algo
assim.
De qualquer forma, o preço dessa marca de refrigerante
de uva subiu, o que eu meramente fiz, e deixei o resto acontecer, e agora estou vendo o resultado.
Os motivos não são muitos precisos já que eu simplesmente determinei que o
preço subisse sem especificar as causas disso. Mas isso alterou em muita coisa.
Começou 67,52 segundos após o preço subir.
Graças à subida do preço, uma criança ficou irritada
aos seus pais dizerem que não iam comprar por que não valia a pena. Isso foi no
aeroporto. E era um domingo. A família estava abandonando aquele país gelado da
América do norte, e foi tirar umas férias no caribe. Como a criança ficou
emburrada durante o voo, os pais lhe deram uma bronca quando chegaram ao
destino. Graças a isso, acabaram chegando 2,25 minutos atrasados, o que causou
algo interessante: coincidentemente uma anomalia espaço-temporal estava dando
um passeio por ali, e a probabilidade de alguém a encontrar é a mesma de você
encaixar a ponta de um cabo USB no computador sem olhar e sem errar no mínimo 2
vezes – não que seja difícil acertar de primeira, na verdade, a chance é de
50%, porem as pessoas tem em suas mentes de que isso é quase impossível – e
acabam colidindo com ela, o que causou perturbações na mesma, alguns traumas com espirais, e uma obsessão
por queijo.
Pelo menos eu acho interessante.
Mas o resultado disso foi que essa anomalia criou outra
realidade.
Essa realidade era no mínimo, diferente da realidade onde
o preço do refrigerante de uva subiu – por enquanto, chamaremos a realidade do
refrigerante de “L1H” e a outra de “L6H”, e creio que o motivo de eu chama-las
assim se revelará em breve. Os humanos de lá eram, quase, mas nem tanto, iguais
aos humanos da realidade L1H. Os detalhes virão depois, tenho certeza. E tinha
uma coisa por traz do motivo da anomalia estar vagando pela L1H, envolvendo
algo com a palavra centro. Mas certamente chegaremos lá com o tempo.
Essa realidade foi criada a partir de mesclas de várias
outras quase aleatórias. E vai causar muitos problemas em breve.
Foi assim que tudo, ou melhor, é assim que tudo vai
começar.
Especificamente, o surgimento repentino dessa realidade
influenciou em um sonho. O sonho era bem estranho e chato. O sonho tem dono. É
um rapaz que vai desejar nunca as segundas terem existido (e logo depois, as
uvas também. Claro, o aumento do preço era culpado de iniciar tudo isso, e
outra coisa também).
E Então...
– Não, pera, pare
ai mesmo.
– O que é? Não
gostou da história? Sabe, eu tento fazer ela ficar mais explicativa ou...
– Não é isso, você
tinha falado que tinha algo interessante para nos contar, que viu algo
incrível.
– Isso mesmo – fala
o cara a minha direita.
– É que você tinha
dito... – prossegue o cara a minha frente.
– Hã?
– ...Que era uma
história verídica – logo após a pausa, percebo o que acontece na mente deles.
– É sim, estou
contando agora pra vocês o que eu vi.
– Não sabia que
vocês era deus.
– Ah, isso...
– Se você realmente
presenciou tudo isso, pelo menos fale a verdade.
– Bem, eu... Não,
não sou deus, eu apenas... Tinha uma calculadora bem grande, uma espaçonave
capaz de viajar entre o tecido quadridimensional dos eixos de probabilidade, e
calculei a probabilidade do que poderia acontecer caso eu mexesse nas contas
bancarias de uma empresa de refrigerante, e descobri que em uma dimensão um
monte de coisa aconteceria caso eu fizesse isso, logo, eu fui para lá e fiz o
preço do refrigerante de uva aumentar, e foi assim que tudo aconteceu. Estou contando
a vocês o que supostamente vai acontecer em algumas horas.
– Oh, o computador
calculou?
Eles olhavam
abismados.
– Tu-tudo...?
– Toda a cadeia de
eventos de varias múltiplas realidades causadas por um evento insignificante e
singular? – perguntava outro.
– Exato, e agora
contarei tudo a vocês. Tem bastante coisa. Adoro este universo.
A roda de amigos
(que agora estavam no estabelecimento de chocólatras anônimos, um clube no qual
eu participo frequentemente) se agita. Tínhamos reunido todos, e agora eu contaria
uma historia magnifica, enquanto comíamos barras de chocolate roubadas da Terra
da dimensão L34H. Pra falar a verdade, eu não vou contar a eles. O computador
irá mostra-los.
– Podemos começar?
– pergunta um.
– Claro. Vamos ver
o que vai acontecer, de maneira bem legal. Eu acho.
Aproximo-me do
computador. Antes de dar Play no vídeo emulado pelo poderoso computador que
desenvolvi por anos, parei para pensar durante alguns segundos. Penso, e o
resumo seria “Não. Melhor não. Claro que
não preciso fazer isso”.
Dei o Play no vídeo
emulado pelo computador.
Volto a sentar
junto com os colegas chocólatras.
Penso no que eu
havia pensado antes.
Eu tinha pensado
que talvez minha interferência nessa dimensão cause muitos problemas. E talvez
pensasse que seria melhor voltar no tempo e espaço para dar uma bronca comigo
mesmo e cancelar isso tudo. Não. Melhor não. Claro que não preciso fazer isso.
Não preciso me preocupar. Não vai acontecer nada aqui. Nesse momento fiquei de
saco cheio de tanto pensar na palavra não. Eu tinha viajado muito pelo espaço.
Depois avancei pelo tempo. Logo após isso, o tempo-espaço. Aí as coisas
perderam o sentido, embora sempre fosse assim, já que tudo perdia o significado
cada vez que eu avançava por um novo plano de eixo da realidade. Mas agora eu
estava ali, reunido com todo mundo dos velhos tempos. Naquela época gloriosa,
quando o espaço ainda era grande, o tempo muito extenso, e a vida muito... Bem,
acho que o “inefável” age agora. Mas o que a vida tinha de especial, era sua
incapacidade de ter significado. Era algo magico. Agora estamos aqui. As coisas
são pequenas, e a vida muito grande.
Aliás, não posso
voltar no tempo para dar uma bronca em mim mesmo. Da ultima vez que fiz isso
(ou tentei fazer), acabamos (eu e ele, que também é eu) brigando, e depois
ficamos bêbados e não resolvemos nada.
Vamos assistir e
ver o que acontece.
Mas logo eu levanto
e coloco no avanço rápido para chegar à parte onde eu estava contando para
eles. O som surge. E a imagem... Bem, não foi possível definir se ela veio
antes, depois o ao mesmo tempo do som, mas tenho certeza que a mesma estava bem
segura do sincronismo entre ela e o som.
“Especificamente, o surgimento repentino
dessa realidade influenciou em um sonho. O sonho era bem estranho e chato. O
sonho tem dono. É um rapaz que vai desejar nunca as segundas terem existido (e
logo depois, as uvas também).”
“E Então...”